Essa história é típica do teatro. Estava fazendo assistência de produção de espetáculos acadêmicos, pois produção é uma área complexa mas muito necessária em nosso ramo e que tive um contato tímido durante o curso, no sentido profissional. Apenas no último período que pude compreender um pouco melhor essa área através de aulas específicas sobre isto. Porém, em minha defesa, quando se fala de amadorismo, confesso que auxiliei na produção de diversos espetáculos.
Me surpreendi muita vezes com a magia que ocorre por trás de cena para que tudo ocorra bem em cena! As vezes até acho que uma pessoa entediada deveria entrar no backstage de qualquer teatro um dia e com certeza sairia diferente. O público nunca saberá quanta coisa ocorre para teatro acontecer, mas também acho que faz parte da magia não revelar os segredos.
Enfim - retorno ao tópico em meio as minhas voltas e viagens - estava fazendo assistência de produção do espetáculo Crave, ou Ânsia em português, da autora Sarah Kane. E eis que faltando poucos dias para a estréia um ator precisa se afastar devido a uma cirurgia de emergência no apêndice, ou a famosa apendicite. O diretor, sem pensar duas vezes, comunica a turma que eu vou substituir o mesmo, sim, para minha surpresa, antes mesmo do ano acabar eu entraria em cena novamente.
Esta é a segunda vez que sou chamado para substituir um ator faltando pouco tempo para estréia, acho que faz parte do meu karma... Pedi muita força a minha fé e meus amigos. Tive um suporte sensacional e um emocional muito centrado. Pude me dedicar com cuidado e surpreendentemente decorei o texto com um facilidade assustadora. Acho que o teatro quando sente que o espetáculo está correndo o risco de não acontecer, abraça qualquer um que apareça para ajudar, seja da forma que for.

O espetáculo pós moderno de Sarah Kane trazia particularidades nunca antes vividas por mim em qualquer outro personagem ou peça. Os atores deveriam ficar de pé durante praticamente uma hora de espetáculo, e não existia contra-cena mas sim um diálogo direto com a platéia, algo que para mim foi muito desafiador, penetrar no olhar daquele que nunca ou raramente encarei durante meu ofício. Algo que exigiu uma concentração e uma força surreais.
Foi muito importante para mim passar por todo esse desafio como pessoa e como profissional. Recebi um acolhimento dos colegas de trabalho e do diretor que me facilitou muito durante o percurso. Fora uma grande parceira que tem me ajudado em diversos aspectos. Acredito que tudo isto foi imprescindível para que ocorresse tudo da forma que ocorreu.

Não posso deixar de relatar que na minha última apresentação acabei me sentindo fraco e tive que sair de cena, o que me conforta é que deveriam faltar apenas 10 minutos de espetáculo, e por sorte o ator que eu estava substituindo estava na platéia e sabia o texto. Eu me senti fraco desde o meio do espetáculo e resisti até meu máximo, mas se eu não saísse de cena eu cairia no chão.. e o que não ocorreu em cena ocorreu assim que saí dela. Cai na coxia e lá fiquei até o espetáculo acabar e o elenco me encontrar desmaiado no chão.

Acredito que a soma de iluminação muito forte, ar condicionado razoavelmente fraco e figurino pesado tenham contribuído para esse resultado. Fora o nervosismo de entrar em cena com poucos dias de ensaio. Mas não me machuquei e estou bem, firme, forte e grato por tudo que vivi.
Esse post eu dedico aos responsáveis pelo desafio enfrentado, a todos que me auxiliaram direta ou indiretamente no processo, a essa parceira que trouxe uma nova energia para mim, aquele leitor que me mandou um e-mail revigorante sobre a importância de meus relatos aqui, aqueles que cuidaram de mim quando me encontraram desmaiado. A todos vocês, muito obrigado de coração!





































