"Peço uma coisa, falem essas falas como eu as pronunciei, língua ágil, bem claro. Se é para berrar as palavras, como fazem tantos de nossos atores, eu chamo o pregoeiro público para dizer minhas frases. E nem serrem o ar com as mãos o tempo todo. Moderação em tudo. Pois mesmo na torrente, tempestade. Eu diria até no torvelinho da paixão, é preciso conceber e exibir sobriedade, o que engrandece a ação.
Ah, me dói na alma ouvir um desses latagões robustos, de peruca enorme, estraçalhando uma paixão até fazê-la em trapos, arrebentando os tímpanos dos basbaques que, de modo geral, só apreciam berros e pantomimas sem qualquer sentido. A minha vontade é mandar açoitar um indivíduo desses, mais tirânico que termagante, mais heroico que Herodes. Evitem isso por favor.
Mas também, nada de contenção exagerada, teu discernimento deve te orientar. Ajuste o gesto a palavra, a palavra ao gesto, com o cuidado de não perder a simplicidade natural, pois tudo que é forçado, deturpa o intuito da representação, cuja finalidade, em sua origem e agora, era e é, exibir um espelho a natureza, mostrar a virtude sua própria expressão, e ao ridículo sua própria imagem, e a cada época e geração, sua forma e efígie.
Ah, eu tenho visto atores, e elogiados até, e muito elogiados, que para não dizer de forma profana, eu diria que não tem nem voz, nem jeito de cristãos, ou de pagãos, sequer de homens! Berram ou gaguejam de tal maneira, que eu me pergunto se não foram feitos por qualquer aprendiz da natureza, tão abominável é a maneira com que imitam a humanidade."
Trecho extraído da tradução de Millôr Fernandes, para aula de interpretação de Celina Bebiano.
Tivemos que decorá-lo com seus verbos de ação, "decupá-lo" inteirinho, para interpretarmos da maneira mais adequada de acordo com a nossa concepção. Achei ele tão interessante e inteligente, que postei aqui para vocês. Bom início de semana para todos!
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